Rondeau andantino grazioso
Ando meio duro, outro dia
tive de aceitar um texto acadêmico pra traduzir para o inglês. É
"versão", explicou a "autora".
Fileira interminável de
verbos derivados de substantivos, "potencializar" sendo o mais
manero.
Há anos venho me prometendo
obrar uma caricatura devastadora e hilária para expor esses monstrengos
textuais. Qualquer dia desses acordo cantando e crio ânimo.
Talvez
seja tarefa demasiado árdua pra este meu coraçãozinho que nos últimos tempos
deu de ameaçar parar a cada três sístoles. Se e quando, será uma detonação
extática.
Detonar,
esse sim é verbo de verdade. E que, como qualquer outra gíria relativamente produtiva,
faltava no vernáculo. Pode perceber. Quando um, com perdão da palavra,
neologismo se espalha por corações e mentes feito "o" dengue
hemorrágico no desgoverno Lula, é sinal de que veio preencher uma, ugh, lacuna.
E
há tanta coisa em nossa cruel realidade brasílica conspurcada pela nova ética
lulopetista que está a pedir uma detonação.
No
meu dia-a-dia, falando sozinho ─ sou um lobo da estepe, não tenho ninguém com
quem conversar, afora um ou outro weirdo que frequenta o boteco do Lacerda ─, é
uma das que mais uso. Quero detonar tudo. O que não quero é porque já foi
detonado.
Eu
mesmo venho me detonando. Há longo, longo tempo.
Quer
expressãozinha mais reconfortante que com-certeza?
Hoje
me espanta que o pessoal pudesse responder perguntas antigamente sem um
ready-made com-certeza pra tacar na bucha. Gosh, não tem vade mecum mais
vicário. Resolveu o problema de comunicação de noventa por cento dos
brasileiros.
E,
Christ, o gerundismo. Fico cada dia mais deliciado. Os profes pasquales da vida
já torraram o saco com sua lenga-lenga antigerundista, tá na hora de fecharem a
matraca. Estamos vivendo, não estamos? A vida vai fluindo, não vai? A mesma
teoria do com-certeza se aplica aqui. Feito uma luva. Vou estar detonando a
língua! Genuína literatura coletiva! O povão estando unido no mais feérico
poema gerundista jamais urdido.
Alguém
precisa macaquear os françois em sua inventividade linguística e deslinguiçar
um romance de novecentas páginas todinho feito de gerúndios para estar
escrevendo um livrinho arretado para estar fazendo sucesso nas escolinhas de
letras do meu sertão derivando.
Em
mãos competentes estaria gerando uma obrinha-prima, com certeza.
O
gerundismo é tão assobertante, que ninguém escapa. Já vi muito mestre da USP
deslizando altaneiro num ando indo da vida. Até eu tem dia ando baixando a
guarda e incorrendo extasiado num periodozinho composto de três verbinhos
interligados pelo mais nefando ativismo em venerando estado latejando.
E
a facilidade com que o povo do Berção assimilaram... o gerúndio em suas
atividades domésticas e comerciais é, como diria o Gianotti, sintomática,
praticamente telegênica.
Não
há volta.
O
jeito é ir introjetando o bicho e incorporando sem filtro todas as novidades
saxônicas trazidas pelos ventos soprando lá do norte.
Meio
Berção anda escrevendo semiinglês sem saber, e não estou falando do gerundismo.
Metade do que os personagens das telenovelas ficam mumunhando é pastiche dos diálogos
de roliúde.
Os
intelectualizados... esses são os primeiros a envenear o vernáculo com os mais
"bizarros" estrangeirismos. O gerundismo é apenas sinal de que já
estamos todos pensando em inglês.
Ou
tentando. Eis outra tese acadêmica que pretendo desenvolver se um dia tiver
saco pra. E é a nossa mais incontornável sina. Em cinquenta anos, se o planeta
etcétera e tal, a última flor do Láscio idem.
Espero "realmente"
ter tempo de desenvolver minha tese. No mínimo os semiliteratos que pululam em
nossas "faculdades" irão aprender o que escrever is all about.